Há algum tempo, o debate econômico tem tratado da
preocupante situação da indústria de transformação brasileira, da perda de
competitividade que tem resultado em aumento dos produtos primários na pauta de
exportação e da ocorrência de um processo de redução de seu peso no PIB
nacional (desindustrialização). Nesse debate, a questão essencial é o papel da
indústria de transformação para o desenvolvimento econômico brasileiro.
Uma indústria de transformação mais competitiva e
dinâmica potencializa o avanço da produtividade, do investimento e do capital
humano. Isso acontece por um conjunto de atributos do setor, apresentados a
seguir.
A indústria de transformação é uma indutora fundamental
para a expansão do investimento produtivo. Apesar da perda de participação no
PIB, a indústria de transformação oferta boa parte dos "bens de
investimento" da economia. Segundo as Contas nacionais, nos últimos anos,
a Indústria de Transformação foi a origem de 55% de toda a FBCF (Formação Bruta
de Capital Fixo) realizada pela economia nacional. Logo, uma manufatura
dinâmica e competitiva é capaz de engendrar um círculo virtuoso de novos
investimentos produtivos, condição necessária para o crescimento econômico.
Dentre os maiores setores de atividade, a indústria de
transformação é a que mais recompensa com aumentos de salários o aumento do
grau de escolaridade. O salário real nos níveis superiores de escolaridade é
mais elevado na manufatura, se comparado com o setor de serviços (com ou sem
comércio) e a agropecuária. Além disso, a atividade industrial emprega pessoas
com maior grau de formalização, o que implica respeito a direitos sociais e
previdenciários.
Se o país almeja ingressar no clube dos países
desenvolvidos em um reduzido espaço de tempo, será necessário que se recupere a
capacidade de investir
Paulo Francini, diretor do Departamento de Pesquisas e
Estudos Econômicos da Fiesp e Ciesp, sobre a necessidade de retomada do setor
industrial
A indústria de transformação é, ainda, capaz de agregar
alto valor por trabalhador, em especial nos países emergentes em trajetória de
desenvolvimento semelhante à do Brasil. Enquanto o valor adicionado médio por
trabalhador para o conjunto da economia brasileira é de R$ 37,8 mil, na
indústria de transformação é de, em média, R$ 49,6 mil, ou 31,3% superior.
É a principal origem das atividades de invenção, inovação
e difusão de novas tecnologias, as quais sustentam aumentos contínuos de
produtividade por toda a economia, criando também as condições necessárias para
o surgimento de um setor serviços de elevado valor agregado.
Com base nas evidências elencadas, fica claro não somente
a grande capacidade da manufatura de influenciar positivamente os fatores
determinantes do crescimento econômico em longo prazo – produtividade,
investimento e capital humano –, bem como seu papel central como vetor de
crescimento, capaz de traduzir o maior ativo econômico brasileiro, que é o
mercado interno, na forma de maior produção, emprego e renda.
Se o país almeja ingressar no clube dos países
desenvolvidos em um reduzido espaço de tempo, será necessário que se recupere a
capacidade de investir, que está fortemente associada à retomada do setor
industrial.
A história de outros países, sobretudo os asiáticos, com
destaque para Japão e Coreia do Sul, mostram ser possível um rápido crescimento
da renda em um período relativamente curto. O fato comum entre esses países é
existência e a execução de um plano de longo prazo para o desenvolvimento do
país, que combine ações para ampliação da competitividade sistêmica da economia
(educação, infraestrutura, juros, eficiência tributária etc.) com uma política
industrial vinculada a esses objetivos, priorizando setores com base na
importância estratégica que terão para o futuro do país.
No caso brasileiro, estamos abrindo mão de um patrimônio
conquistado a duras penas durante cinquenta anos que é uma indústria forte e
diversificada. Mais preocupante ainda, é que estamos perdendo nossa indústria
antes de se criar as condições necessárias para o desenvolvimento de um setor
serviços de elevado valor agregado associado ao setor industrial, que foi a
opção feita por países que obtiveram sucesso no desenvolvimento econômico e
social.
*Paulo Francini é diretor do Departamento de Pesquisas e
Estudos Econômicos da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo