“Assim como em várias outras indústrias, na área gráfica há uma tendência de crescimento distinta quando comparada com mercados maduros, como Estados Unidos, Canadá, Japão e Europa Ocidental. Nesses países, o setor gráfico é mais estabilizado e o mercado cresce menos do que o crescimento da economia. Neles há ainda a substituição de produtos impressos por eletrônicos, bem mais forte do que na América Latina.”
“A gráfica terá de ser uma extensão do cliente. Isso pode fundamentar a maior presença das multinacionais.”
Convidada, pelo segundo ano consecutivo, para fazer um prognóstico da indústria gráfica da América Latina para a Printing Industries of America (PIA), entidade que publica anualmente uma projeção mundial sobre a indústria, a ANconsulting, por meio de seu diretor, Hamilton Terni Costa, fala para a GRAPHPRINT sobre as tendências modernas.
Além da participação na PIA, Costa aborda durante a entrevista algumas transições importantes que devem se tornar, num presente próximo, inerentes ao meio gráfico.
Uma delas é a evidência de grandes aquisições no nicho de embalagens. “O movimento de aquisições deverá crescer nos próximos anos, tanto no Brasil como na América Latina. Já começamos a viver isso na área de embalagem a um bom tempo. A grande questão é que a embalagem, que acondiciona o produto de consumo, está diretamente ligada a grandes contas internacionais e quem acaba consolidando o segmento é o próprio cliente, que força os fornecedores a se tornarem mais fortes. É o cliente que acaba consolidando o mercado”, aponta.
Outra novidade aos leitores da GRAPHPRINT é que Costa, juntamente com outros profissionais do meio e um grande centro de ensino da indústria gráfica, começa a difundir o Instituto Nacional de Gestão Empresarial.
A meta é clara: disseminar cursos de gestão em todo o Brasil.
As novidades – tendências – não cessam aqui. Continue lendo a entrevista, pois você pode se surpreender. Afinal, Costa é um ser do habitat gráfico, conhece sua atmosfera e, portanto, suas intempéries.
Por Fábio Sabbag
GRAPHPRINT: Conte-nos, não esconda nada, sobre o prognóstico elaborado?
Costa:
Fizemos uma análise primeiramente do quadro econômico dos países. Depois, entramos em contato coma as associações e os empresários gráficos mais representativos dos respectivos países.
Entrevistamos, montamos, trocamos ideias e definimos o panorama geral. A grande vantagem é que viajamos por todos os países da América Latina, pois temos clientes ou fazemos apresentações neles.
Na realidade, o prognóstico mostra que temos seis países – Argentina, Brasil, Colômbia, Chile, México e Peru – que ostentam 90% do mercado de impressão.
A Venezuela, por exemplo, tem importância econômica, mas na área gráfica mais importa do que produz.
Chegamos então à conclusão de que é o momento da América Latina. Assim como em várias outras indústrias, na área gráfica há uma tendência de crescimento distinta quando comparada com mercados maduros, como Estados Unidos, Canadá, Japão e Europa Ocidental.
Nesses países, o setor gráfico é mais estabilizado e o mercado cresce menos do que o crescimento da economia. Neles há ainda a substituição de produtos impressos por eletrônicos, bem mais forte do que na América Latina.
A América Latina, em função do incremento da quantidade de consumidores, ainda tem um acréscimo de produtos tradicionais da área gráfica.
"A elevação das classes sociais no Brasil, por exemplo, além de evidentemente aumentar o consumo, faz as pessoas abrirem conta em banco, há maior emissão de cartão de crédito, disparam as vendas de celulares, carros, cosméticos, entre outros."
Mesmo assim o consumo médio de produtos impressos ainda é muito menor do que os níveis atingidos nos EUA e na Europa Ocidental. E, possivelmente, não chegaremos a esse nível. No passado havia o pensamento de que a indústria gráfica do Brasil evoluiria com o objetivo de atingir o grau de outros países desenvolvidos. Particularmente acho que dificilmente vai acontecer e ao mesmo tempo, apesar de ser um mercado crescente, o processo de substituição do material impresso vai impedir que isso aconteça. É uma questão de tempo.
Por outro lado há ainda as diferenças culturais. O Brasil é um país que não foi educada por meio da leitura, sempre fomos alimentados pelo rádio e depois pela televisão.
Os EUA, por exemplo, têm o predomínio de protestantes, uma leitura de Bíblia mais comum e, claro, o próprio nível de educação, bem superior.
E o nível de educação é relacionado ao grau de consumo. Mesmo crescendo, com o processo de substituição de tecnologias, dificilmente chegaremos ao mesmo patamar. Mesmo assim, como curva de crescimento, a nossa é mais forte e deve continuar assim nos próximos cinco anos.
GRAPHPRINT: Até porque os países comparados com o Brasil já cresceram onde tinham de crescer...
Costa:
Exatamente, têm o mercado estabilizado. E por terem mercado estabilizado e antigamente fragmentado em termos de gráfica a indústria desses países, com o tempo, foi sendo consolidada. As gráficas passaram a comprar outras gráficas com o intuito de constituírem grupos maiores e obterem fatias mais significativas de mercado.
“O movimento de aquisições deverá crescer nos próximos anos, tanto no Brasil como na América Latina também. Já vivemos isso na área de embalagem a um bom tempo. A grande questão é que a embalagem, que acondiciona o produto de consumo, está diretamente ligada a grandes contas internacionais e quem acaba consolidando o segmento é o próprio cliente, que força os fornecedores a se tornarem mais fortes.”
Na área de embalagem já há uma participação estrangeira no Brasil maior do que em outros setores. Nos outros nichos da indústria gráfica surge a tendência de consolidação também. Num mercado muito fragmentado, as empresas percebem que necessitam de uma fatia maior e para isso terão de fazer investimentos. Falamos disso ano sim, outro também, mas ainda não é um movimento sensível. Mesmo assim é uma tendência que acontece quando as dificuldades aumentam.
GRAPHPRINT: Muitos artigos e até mesmo os próprios executivos do setor afirmam que na Europa, por exemplo, as famílias modernas são bem menores e há um expressivo número de solteiros. Há quem diga que esse movimento já chegou ao Brasil. Esse fato mexe com a indústria de embalagem? É preocupante?
Costa:
O aumento de mercado e a elevação do número de consumidores refletem diretamente na utilização das embalagens. A variedade é maior e os produtos são vendidos independentemente se o núcleo
familiar atual é menor. A forma que as embalagens irão se apresentar é outra discussão. Há a importante questão da sustentabilidade.
Hoje, as embalagens são elementos importantes dentro do processo de venda: 70% da compra é baseada em segundos e, por isso, as embalagens têm de ser atrativas, instigantes. No embalo, os materiais usados na confecção da embalagem ganham valor agregado.
As embalagens precisam chamar a atenção do consumidor e ao mesmo tempo trazer economia ao seu produtor. As gráficas que produzem embalagens terão de lidar com uma diversidade de materiais maior.
Consequentemente, a empresa terá de disponibilizar diferentes processos de produção. É o momento de combinar diferentes tipos de impressão para conseguir atender diferentes demandas da indústria gráfica.
A gráfica terá de ser uma extensão do cliente. Isso pode fundamentar a maior presença das multinacionais. O inverso também acontece. Os próprios clientes da Gráfica Gonçalves levaram a empresa para o México devido ao alto nível de atendimento e ao excelente serviço prestado aqui no Brasil.
GRAPHPRINT: Em 2011, de dez gráficas visitadas pelo jornalismo da Agnelo Editora, 11 afirmaram que pretendiam entrar no segmento de embalagens. É um movimento saudável?
Costa:
Saudável não é, pois o mercado vai ficando mais disputado. E os mercados tradicionais jogam o preço para baixo, diminuindo margens, consideravelmente.
Já na área de embalagem, a possibilidade de substituição, que os outros produtos impressos sofrem, não é real. Por isso, muitas empresas têm migrado para o segmento. Definitivamente começa o processo de concentração de negócios.
Na sequência, as empresas mais fortes acabam comprando outras do meio. Nesse assunto há uma certeza: são os clientes das gráficas que acabam forçando o fornecedor a se tornar mais forte.
Como tendência, acreditamos que as gráficas desse segmento sejam incorporadas a produções internacionais, ficando ainda mais fortes para suportarem a questão do preço e a modernização tecnológica. Hoje a gráfica precisa vender, ser ecológica e ser econômica.
GRAPHPRINT: Entramos então no espinhoso tema da gestão empresarial?
Costa:
A questão da gestão na indústria gráfica está crescendo. Coordenamos o curso de pós-graduação e gestão no Senai. Fazemos isso exatamente para começar a preparar os novos gestores ao que denominamos de nova gráfica.
A nova gráfica exige muito mais do que impressão. Com isso, sentimos a demanda de levar ferramentas de gestão ao Brasil de uma forma mais ampla. As empresas sentem a necessidade de prepararem seus gestores.
Assim, lançamos o Instituto Nacional de Gestão Empresarial, que tem como meta a disseminação de cursos de gestão ao setor gráfico em todo o Brasil com o reconhecimento do Senai, pois é um curso com base na área de gestão da escola.
Formamos um núcleo de professores e levaremos ao Brasil a base desse curso de gestão. Precisamos levar técnicas de gestão para os empresários. Os cursos começam neste ano, mais precisamente no segundo semestre.
Já em 2012, o presente da indústria gráfica é dividido em dois aspectos: eficiência e criatividade. Hoje, os profissionais estão sendo levados a trabalhar com níveis de preços baixos. São esses níveis baixos que pressionam a eficiência.
É o momento de retrabalhar a produtividade, eliminando desperdícios.
Há a criatividade. Somente o serviço de impressão, talvez, não seja suficiente para sobreviver numa era de convergência entre mídias. O serviço tradicional de impressão, então, começa a ficar limitado. Atualmente, usamos três ou mais mídias. Pensar somente em uma, como prestação de serviço, limita, evidentemente.
Como tendência enxergamos que a empresa moderna tem de fornecer meios de comunicação e ampliá-los.
A ANconsulitng marca forte presença na impressão digital e por isso lidamos com um conjunto de soluções. Uma gráfica, por exemplo, pode ser hoje uma fornecedora de serviço de marketing.
GRAPHPRINT: Mudar a cultura de uma empresa não é tarefa simples e bem vista pelos fundadores. A quebra de paradigmas é evidente. Mesmo assim forma uma barreira natural?
Costa:
É por isso que a ANconsulting presta serviços em forma de consultoria, retrabalhando modelos e planos de negócios e estratégias de marketing.
A empresa tem de entender as soluções de uma forma geral e como elas se convertem em suporte e desenvolvimento comercial e trabalho interno, ainda que seja com uma rede de parcerias. É um processo de aprendizagem.
As empresas que já fizeram essa transição vivem num processo de aprendizado nos últimos seis anos, aproximadamente.
É preciso começar a procurar até para criar diferenciais. Esse é um caminho que tira a empresa da disputa de preços somente.
Como conclusão é ter de um lado a eficiência para suportar a pressão de mercado e, do outro, a criatividade para crescer na oferta e sair da única questão preço.
GRAPHPRINT: 2012 é o momento da pequena ou média indústria?
Costa:
Eu diria que o momento é a todo instante, não somente em 2012. Não é uma questão de tamanho, é uma questão de mentalidade.
Esse é um assunto interessante, pois atendemos empresas pequenas cuja mentalidade é grande.
E isso efetivamente significa que a empresa tende a trilhar caminhos diferenciados e pode ter a chance de crescer rapidamente, mais velozmente até do que gráficas tradicionais.
O desafio atual das gráficas não é o porte dela e sim o seu plano de visão.
GRAPHPRINT: O caminho da diferenciação passa pela impressão digital?
Costa: Não necessariamente. Sempre dizemos que a impressão digital não é obrigatória, mas cada vez mais necessária.
“A gráfica terá de ser uma extensão do cliente. Isso pode fundamentar a maior presença das multinacionais.”
Muitas empresas podem crescer, mas a realidade é que aquelas que souberem complementar seus processos com a impressão digital criarão ofertas completas.
Há outro aspecto embutido nesse tema. Antes comprávamos máquinas para durar 20, 30 anos.
A máquina, na realidade, é um meio para produzir aquilo que o cliente precisa e sua necessidade muda rapidamente. Daqui a três ou cinco anos, a necessidade, provavelmente, será muito diferente.
Aqui, o equipamento digital, que parecia desperdício do ponto de vista da gráfica convencional, passa a ser realidade tangível ainda que atinja níveis de produção mais baixo do que outros sistemas.
Comprar um equipamento offset pensando em usá-lo por 30 anos não é uma decisão muito sensata atualmente
É difícil pensar que daqui a 30 anos usaremos a impressão offset do mesmo jeito. É uma mudança total de cultura e ainda estamos no meio dela.
GRAPHPRINT: Você enxerga 2011 como um bom ano para a indústria gráfica?
Costa:
Já não sei mais o que é ano típico ou atípico.
Em 2011 tivemos uma inversão de tendência, ou seja, o segundo semestre, em função do desempenho da economia brasileira, que é tradicionalmente muito melhor do que o primeiro semestre, foi pior do que os primeiros seis meses do ano.
No segundo semestre, as gráficas ligadas à área industrial e, principalmente, aquelas ligadas à área de embalagem sofreram muito.
A partir de agosto de 2011 o mercado parou. Logo, tivemos um final de ano ruim e que, seguramente, assustou, além de prejudicar muitos investimentos.
Voltaremos, creio, ao normal em 2012, sé é que o normal existe, claro.
As alterações econômicas estão sendo feitas e vai depender também do que pode acontecer no exterior.
Talvez não tenhamos uma drupa tão forte em relação à edição passada.
É o momento de repensar. Definitivamente não dá para comprar equipamento e pensar que ele vai vender. O investimento é específico, é um produto para determinada demanda.
Em outubro passado conversei com o presidente da Heidelberg e ele falou que essa Drupa vai ser o evento do repensar quais serão os novos modelos e como, a partir da tecnologia, modificar a maneira de produzir.
GRAPHPRINT: E como anda a ANconsulting?
Costa:
Pensamos ininterruptamente no reposicionamento de mercado com foco forte na área digital. Trabalhamos com fornecedores, diversas gráficas, editoras e clientes finais no ajuste de aplicativos.
Foi muito crescente no último semestre e continuará a evoluir a questão da informação. O conhecimento e o reposicionamento, além, claro, da vontade de transformar, são preponderantes.
A própria concretização do instituto de gestão e a disseminação de boas práticas de gestão são fatos relevantes.
Assim, enfim, levaremos novas ideias para a América Latina e para a Europa.
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